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terça-feira, 4 de maio de 2010

Por poucos

Todas às noites, subia no telhado.
O ritual era sempre o mesmo: pegar a escada de madeira (aquela, feita pelo meu avô), encostá-la no telhado, subir e me acomodar sentada em algumas das telhas. Te ver.
A principio, não foi nada fácil. Apoiava a escada me preparando para subir os degraus e então olhava para cima a fim de enxergar o topo da escada, mas nada eu via. A escuridão da noite fazia parecer que, ao invés de subir, eu estivesse descendo um túnel sem saber no que ele daria. Entenda, o lugar e o processo me eram desconhecidos - ainda.
Em algumas noites você se escondia. Eu achava graça.
Gostava da brincadeira e topei brincar algumas vezes. Me escondia e esperava ansiosamente que você também me procurasse.
O tempo passou e, te conhecendo de tantas noites no telhado, notei que a brincadeira não passava de ilusão criada por mim e exclusivamente em meu beneficio.
Você não se escondia. Em algumas noites, você não estava lá. Você não queria estar lá.
Eu estive.
Saiba que nunca me zanguei com você.
Depois de um tempo, comecei a subir no telhado antes de anoitecer. Eu não te via e isso era tudo o que eu procurava. Procurava graça nas tardes sem te ver sabendo que não encontraria.
Isso explica claramente a minha mania em ressaltar erros e defeitos para, então, supervalorizar o que, na minha cabeça - somente na minha cabeça - tem valor e deve ser guardado.
Eu guardei muitos momentos.
Me desculpe por dizer, mas guardei momentos meus. E se me permite, novamente, tenho todos os momentos como meus.
Você teve sua participação em quase todos e chegou a ser protagonista em raros, mas são meus. Eu os fiz sem você sequer notar.
Na última vez que desci, não guardei a escada. Ela continua lá no mesmo lugar, encostada no telhado.
Todos os dias sento na entrada de casa e fico a observando. Gosto de vê-la do mesmo jeito em que a vi na última vez que subi e desci do telhado.
Faço-o todos os dias porque sei que, na minha cabeça - somente na minha cabeça - tem valor e deve ser guardado.

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